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O Fio Vermelho por Isabel Maria Angélica

Foto do escritor: Isabel AngélicaIsabel Angélica
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A minha primeira lua desceu quando eu tinha 11 anos. Lembro-me bem onde estava, com quem e como foi. Não houve celebração nem conversas profundas. Senti dores no meu ventre e estava mal- disposta. Recebi de volta um penso higiênico e um aviso: “Agora vai ser assim todos os meses!”. A minha menarca desceu num corpo de menina e sem eu compreender nada do que estava a acontecer comigo, porém com a indicação de que nada mais seria igual, pois já “era mulher”. Mas sei que a minha mãe fez como podia… como tinha aprendido.

Naquela altura, fiquei confusa, com a sensação de que tinha feito algo de errado. Lembro-me de me sentir culpada e, a cada mês que passava, as minhas luas ficaram cada vez mais dolorosas ao ponto de, nas primeiras horas de sangue, ter de ficar na cama e tomar analgésicos para suportar o momento. Aos 16 anos, optei pela toma da pílula, pois o ginecologista disse que esse método iria ajudar-me na questão das dores. E ajudou, até certo ponto, pois as dores sempre se fizeram presentes como lembrança de que algo estava desajustado no meu útero.

Aos 38 anos, decidi deixar de tomar a pílula definitivamente. A partir daquele momento, a cada descida da minha lua, as dores ficaram ainda mais fortes. Para conseguir funcionar, continuei a tomar os analgésicos que fossem necessários para adormecer aqueles gritos do meu útero. Algum tempo depois, comecei a ter a oportunidade de poder receber a minha lua em casa, sem precisar de me deslocar para o emprego. A cada ciclo, entregava-me às dores, gritava e chorava… Por meio de súplicas entrelaçadas com lágrimas, pedi à Grande Mãe para me ajudar a libertar tanta dor do meu útero.

Um dia, recebi apenas como retorno: “Chora, filha, para que te apazigues com a dor que guardaste por te teres tornado mulher”. Tudo o que vivi na minha menarca guardei como dor. Não houve celebração, nem alegria, apenas dor que o meu útero tão bem guardou ao longo de décadas. E percebi que teria de aprender a ouvir o meu útero e fazer chegar esse caminho a outras mulheres.

A CONFIANÇA NA (MINHA) MULHER

Também aos 16 anos iniciei o caminho da descoberta espiritual. Cedo percebi que o mundo invisível me era familiar. De forma natural, fui recolhendo ferramentas e manifestando um dom mediúnico bem presente. De maneira também natural, fui chamada a apresentar trabalhos de desenvolvimento humano e espiritual, para que chegassem aos demais as oportunidades de crescimento e resgate do amor próprio e poder pessoal que, em dezembro de 2010, me abriram para outro patamar com a entrada das Medicinas Sagradas na minha vida.

Então a Grande Mãe, por meio de sonhos iniciáticos e de um chamado interno a partir da consciência da Serpente, lançou a semente de que estava na hora de eu abrir Círculos de Mulheres. Fiquei apavorada, pois já acumulava algumas traições por parte de amigas e companheiras de trabalho. Contudo, apesar da profunda desconfiança com o feminino, percebi que teria de abraçar este desafio, pois ele iria trazer a minha cura. Surgiu o Ninho da Serpente – Círculos de Mulheres, em maio de 2013.

Em todos os trabalhos com mulheres, tenho vindo a espalhar a importância do sangue menstrual e de elas se apaziguarem com os seus ciclos, a lua e celebrar cada chegada do sangue como se fosse a primeira vez. Algo que eu vou celebrando vez após vez com as mulheres de forma a apaziguar-me com o meu próprio sangue e o meu eu feminino. Em agosto de 2014, recebi uma cura profunda por parte da Grande Mãe. Dentro da Tenda de Suor, onde dirigia um trabalho relacionado ao feminino, consegui finalmente fazer as pazes com a minha mulher, a minha mãe e com as mulheres em geral. Senti que o meu sangue deveria, de algum modo, chegar ao coração da Grande Mãe e que todas as mulheres podiam fazer o mesmo. Naquele momento, realizei que os meus trabalhos pessoais em cada lua se fundiram com o serviço de facilitar os Círculos Mulheres.

A GRANDE VIRAGEM

Em 2015, tomei contato com o trabalho de Andrea Herrera, líder espiritual no Caminho Vermelho e que tem sob a sua responsabilidade o Templo da Lua de Illalo, no Equador. Em julho desse ano, recebi na minha casa de Terras de Lyz a presença dessa Máma Atekokoli que mudou a minha vida.

Ela deixou-me como sugestão de trabalho o caminho de ir semeando a minha lua todos os meses, durante 13 luas, num local protegido e resguardado da minha casa. Explicou-me os mistérios de abrir essa ligação e proteção. Falou-me de uma linguagem que já me tinha sido sussurrada nas minhas luas anteriores e nos Círculos.

Começou aí um trabalho mais profundo e consciente com as minhas águas vermelhas junto à minha Árvore de Poder. Ao mesmo tempo, ela deu-me a autorização, com toda a Linhagem de Maiores que carrega, para abrir um espaço sagrado onde as mulheres pudessem, em segurança e proteção, entregar as suas águas vermelhas à Grande Mãe. Senti o impacto da responsabilidade. Tremi. Mas aceitei o desafio. Seria uma forma de caminhar no que defendo: todas as mulheres terem direito a celebrar a sua lua e a oferendar o seu sangue, em segurança, de volta à Mãe Terra, tal como os nossos corpos sabem que é natural ser feito.

Essa missão só pode ser assente na minha própria experiência. E, durante as minhas luas, vivi os processos mais incríveis e sanadores, consolidei o meu caminho interno, abri portais mais profundos de intuição, fiquei mais segura de que a minha voz uterina estava conectada com o coração e útero da Mãe.

Um ano depois, em julho de 2016, Andrea Herrera regressou. Falamos, trocamos ideias, partilhei processos das minhas 13 luas e do meu caminho pessoal. Chorei, desabafei, ouvi e aprendi. Recebi de volta a validação do caminho interno que estou a fazer e que foi celebrado com a bênção final ao Altar de Lua que está a ser tecido para as mulheres. De volta, recebi o “respaldo” da sua linhagem, que assim entrou no meu campo energético para a minha proteção, guia interno e nos trabalhos.

O Fio Vermelho que une todas as mulheres foi assim conectado à minha matriz energética interna, ao meu útero e ao meu coração. E recebi, naquele momento, a instrução de espalhar para as mulheres o ensinamento do que simboliza esse Fio Vermelho.

O FIO VERMELHO COMO LEGADO

Em setembro de 2013, recebi a minha música de poder. Ela começa com “Sou Filha da Terra, nascida e criada, forjada nas estrelas, chegada até aqui”. Cada vez que a canto, revejo todas as aprendizagens que tenho feito com a minha lua. Vou recolhendo os elementos necessários para ir-me aprofundando no que significa ser Filha da Terra e abrir caminhos a este fio de Águas Vermelhas que nos liga a todas e nos conecta à primeira mulher que sangrou, e cujo símbolo desse primeiro sangue que retornou ao coração da Mãe é a serpente.

Este é o meu caminho e legado: ajudar a despertar as consciências femininas desse movimento espiralado ancestral; encaminhar as mulheres ao resgate desse poder uterino no qual reside a sua ver- dade e em que o cálice guarda as águas vermelhas da vida, morte e renascimento, para que elas celebrem as suas águas e ofereçam o seu sangue de forma responsável e segura! É o meu trabalho – abrir caminhos para que as mulheres cheguem à Grande Mãe, pois Ela chama por todas as suas filhas.

O Fio Vermelho é a canoa que nos permite navegar nas nossas águas internas mais profundas, sabendo que o caminho está iluminado a partir dos nossos corações e úteros. É trazer novamente à nossa história humana a celebração dos rituais de vitalidade, de abundância, de fertilidade e de criatividade.

Eu tenho um sonho: que todas as mulheres entreguem o seu sangue à Grande Mãe, pois sei que isso trará abundância e vitalidade para todos os seus filhos e filhas; que os filhos e  filhas dessas mulheres se tornem melhores seres humanos, porque quem os educa são as mulheres sábias e conscientes; e que estas percebam que o que nos une é um forte e firme Fio Vermelho indestrutível gerado a partir do Útero Primordial.

* Texto inserido no livro FILHAS DA TERRA, coordenado por Inês Gaya e editado no Brasil em Setembro de 2016. Versão adaptada para Português do Brasil.

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